terça-feira, abril 14, 2015

O senhor que contava anedotas

Era uma vez um senhor idoso que tinha um cão.
De Setembro a Novembro o senhor levava o cão à caça uma vez por semana; o resto do ano fazia-lhe festas e passeava-o no quarteirão, às vezes com os netos, outras vezes sem. O resto do tempo ia à ginástica, a jantaradas com os amigos, lia, viajava, via filmes, apanhava linhas presas na alcatifa e arreliava a esposa. E contava anedotas. Sempre as mesmas, sempre diferentes. É que este senhor tinha um dom: conseguia contar qualquer anedota, por mais simples que fosse, de maneira engraçada e, pasme-se, apropriada para qualquer audiência. Quando não era uma anedota completa era uma interjeição no momento certo, uma referência, uma punchline inteligente ou uma abordagem nova a uma piada conhecida. E tinha sempre piada.
Um dia o senhor começou a ficar esquecido. Esquecia-se das chaves do carro, dos óculos escuros e de metade do que acontecia nos filmes, nos livros e no resto. Começou a dizer bom dia, boa tarde e boa noite duas vezes.
De vez em quando dizia que tinha que ir para casa, que a mãe estava à espera dele, e um dia foi.
A esta hora devem estar os dois a rir a bandeiras despregadas, porque mesmo contadas pela metade as anedotas do senhor nunca deixaram de ter piada.


Pssshhht... já pisei uma gasosa!